terça-feira, setembro 25, 2007

WAS? ...



«Antes de me ter encontrado, Irrsigler não tinha, por exemplo, a mínima noção de música, de nenhuma arte, no fundo absolutamente de nada, nem sequer da sua estupidez. Agora, Irrsigler sabe mais que todos esses parladores de história de arte que todos os dias aqui vêm e enchem os ouvidos das pessoas com o seu cretinismo histórico-artístico. Irrsigler sabe mais que esses asquerosos peroradores da história de arte que todos os dias destroem para toda a vida, com o seu palavreado, dezenas de classes escolares que vão impelindo à sua frente. Os historiadores da arte são os verdadeiros destruidores da arte, disse Reger. Os historiadores da arte arengam tanto tempo sobre a arte que acabam por, com a sua arenga, a levar à morte. A arte é levada á morte pelos historiadores da arte. Meu Deus, penso eu muitas vezes, aqui sentado no banco, quando os historiadores da arte passam por mim conduzindo os seus rebanhos inermes, como são de lamentar todas essas pessoas, às quais precisamente estes historiadores da arte fazem perder, perder definitivamente, o interesse pela arte, disse Reger. A profissão de historiador da arte é a mais perversa profissão que existe e um historiador da arte arengador, e só há realmente historiadores da arte arengadores, precisava de ser corrido a chicote, corrido do mundo da arte, disse Reger, todos os historiadores da arte são os verdadeiros destruidores da arte e nós não devemos permitir a destruição da arte por aqueles que, intitulando-se seus historiadores, nada mais fazem do que destruí-la. Quando ouvimos um historiador da arte, sentimos náuseas, disse ele, ouvindo um historiador da arte, vemos como é destruída a arte sobre que ele arenga, com a arenga do historiador da arte a arte atrofia-se e é destruída. Milhares ou mesmo dezenas de milhares de historiadores da arte dilaceram a arte com a sua arenga e assim a destroem, disse ele. Os historiadores da arte são efectivamente os seus assassinos, se escutarmos um historiador da arte, participamos na sua destruição, onde quer que um historiador da arte se apresente, a arte é destruída, esta é que é a verdade [...]».



Thomas Bernhard, Antigos Mestres, trad. José ª Palma Caetano, Assírio & Alvim, Lisboa, 2003, pp. 54 e 55

2 comentários:

carlos ruão disse...

... olha, olha, o meu escritor favorito!!! nada suplanta T.B.!!!
é preciso, todavia, dominar/domar os contextos da sua obra.
Li os «velhos mestres» em italiano e depois, anos depois, a tradução em português.
was?
concordo, concordo, concordo !
a questão levar-nos-ia longe; um dia discutiremos isto.

carlos ruão
historiador da arte (desencantado !? desde a primeira hora e que preferia ser o objecto ao sujeito!)

PS:(há aquele velho lema: quem não sabe, ensina! ou a história do Robert Walsen sobre a Vida e a Educação!) - vai dar ao mesmo...

Carla Alexandra Gonçalves disse...

Was... («o que») para mim, e neste contexto, significa «o quê?», ou uma private joke!

E a propósito de quem não sabe ensina, lembras-te do que TB diz mais à frente, no mesmo livro, sobre os professores (e dos alunos indefesos)? Nem me atrevo a repetir que, para provocações, já basta o aqui ficou transcrito.

TB é um homem duro, desencantando (sim, que vida!) e provocatório, na sua dialéctica da negatividade.

Abraços
c