quarta-feira, janeiro 25, 2006

A sociedade e a arte






Somos forçados a separar as realidades sociais no tempo e no espaço, para que as possamos entender, e para que possamos lidar convenientemente com as suas estruturas.

Falar numa Sociologia das Artes é empreender uma determinada viagem de sonho, porque a sociedade é mutante, alterando-se com o caminhar do tempo e na medida da sua história. A situação cronológica avisa e dá o prumo dos temas sobre os quais se deve ater o sujeito. E para além das sociedades, também o conceito de arte deve ser usado com a devida circunspecção, porque aquilo que até Kant era considerado como Arte pode ter deixado de o ser, e foi-o, certamente…

Deve então falar-se de numa sociologia da arte aplicada ao tempo e, por conseguinte, a uma determinada sociedade? Ou deve ressalvar-se o facto da possibilidade de aplicação de método sociológico quando nos abeiramos desta questão?

O contacto que os sujeitos mantêm com as obras de artes, entendidas no seu valor absoluto, foi-se reformando também por força das alterações de todas as estruturas que os circundam e que os enformam. Não nos restam dúvidas que durante a Idade Média e durante grande parte da modernidade, a relação mantida entre os sujeitos (emissores e receptores) e as obras de arte não é o mesmo que perdura nos nossos dias e, da mesma forma, também as obras de arte contemporâneas possuem já poucos pontos de contacto com aquelas que se fizeram nos períodos da história mais recuados. O exemplo clássico do texto de W. Benjamin («A obra de arte na época da sua reprodutibilidade técnica») ilustra precisamente esta mudança que as novas formas de arte introduziram no plano teórico (a fotografia e o cinema…) e a mudança de relacionamento dos homens com a arte que se democratizou e que se leva para casa.

Grosso modo, devemos acautelar-nos com as tentadoras generalizações que fazemos quando falamos em criação artística, em obra de arte, em recepção da obra da arte, em arte como produção de classe, em arte como motriz das revoluções, em arte como fenómeno religioso, burgês ou capitalista, em arte pública, em arte com autonomia, democrática, ou em arte como símbolo, como fenómeno subjectivo, elitista, de sublimação, como realização de fruição prazenteira ou em arte como mensagem…

Devemos acautelar-nos quando pensamos que o método sociológico pode aplicar-se da mesma forma quando estudamos os movimentos artísticos do século XX, ou quando estudamos o desenvolvimento da arte do Renascimento. As perguntas que nos fazemos são diferentes, porque associadas a uma sociedade que é naturalmente diferente, tal como o próprio conceito “Arte”.

Em determinadas situações sociais, reconhece-se a existência de uma Arte e é neste contexto que a sociologia deve actuar: por forma a compreender o processo segundo o qual se realiza (se mantém e imortaliza) uma determinada forma de Arte, por forma a compreender o processo segundo o qual se realizam as relações que os sujeitos (agrupados ou individualizados) mantêm, ou não, com as obras, por forma a entender os mecanismos de interactuação e de transformação que as obras de arte podem, ou não, desenvolver nos sujeitos.

2 comentários:

Anónimo disse...

E qual é, ou qual tem sido, o papel do artista?
Ana

Carla Alexandra Gonçalves disse...

Relativamente ao papel do artista na sociedade penso ir escrevendo porque, como se depreende, ele também se foi alterando. De uma forma grosseira, os artistas neolíticos, o medievais e os actuais são inevitavelmente diferentes e acompanham, de modos diferentes, o andamento do mundo envolvendo-se, também diferentemente, com a realidade. Bom tópico de reflexão!
CGonçalves