sexta-feira, junho 20, 2008

se a felicidade matasse o homem seria imortal




«Fundo de maneio pago por clientes»

Assim à primeira vista, ficamos sem saber de que fundo de maneio trata a notícia publicada no Correio da Manhã de dia 20 de Junho de 2008.

Podia tratar-se de qualquer assunto, não fosse a conjuntura portuguesa a fazer adivinhar tratar-se de um fundo de maneio para o pobre grupo da EDP: «As facturas de electricidade poderão vir a incluir uma parcela para a constituição de um fundo de maneio para a EDP. Esta é mais uma das propostas da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), que consta de um vasto documento que está em consulta pública.».

Apesar do pouco tempo que tenho, fui à procura do documento que deveria estar publicado na pp. web da ERSE. É que, como sabemos por outras experiências já vividas, as consultas públicas em Portugal não funcionam bem, também porque os cidadãos não têm tempo para este género de investigação. Movida por esse motor de impulsão lá fui tentar achar o referido documento...

... Apesar dos esforços empreendidos, não descobri facilmente o texto em causa. Baixei os braços e decidi voltar à notícia para ler que: «Os documentos contêm centenas de páginas numa linguagem que exige conhecimentos do sector, o que levanta a questão de se saber quantos consumidores conseguirão dar o seu contributo em resposta ao apelo da ERSE. 'Nada está decidido', garantiu ainda fonte da ERSE, explicando que a decisão final só ficará concluuída a 31 de Julho.». Não há volta a dar. A partir de dia 31 de Julho acresce a taxa imposta para que a partir do próximo ano nos unamos para ajudar a pobre da EDP. [Entendo cada vez melhor o sarcasmo do logotipo do grupo, que é aquele sorriso de esguelha.]

Este esforço de pesquisa valeu-me uma certeza. A de que todos nós, todos quantos vivemos neste país governado por uma mole em cujo topo está instalado o velho Conde de Olivares, vamos concorrer para ajudar a pobre da EDP (na construção de um fundo de maneio a que somos obrigados, no pagamento das dívidas de consumidores caloteiros, entre outras ajudas subliminares...). Ajudaremos tanto a pobre da EDP, tal como temos vindo a ajudar tantas outras entidades a gerir os seus fundos bilionários, até que os nossos se esgotem, e já esteve mais longe disso.

[Irrita-me já profundamente ser portuguesa... Este sentimento de pertença a coisa nenhuma que nos une na triste ineficácia, no pacifismo amorfo, na alienação incolor, no virar das costas aos problemas, este sentimento de perten��a a uma casta escravizada e sem ganas é, para mim, um fenómeno arrepiante. Mas isto de ser portuguesa tem o seu lado positivo: ninguém nos governa de facto. E isso é bom! Somos livres!, amigos, somos livres! Estamos livres de tudo, particularmente de quem nos possa proteger... pena é que não estejamos livres para escolher a quem queremos ajudar com o nosso curto rendimento, pena é que não estejamos livres para crescer, pena é que não estejamos livres dos cúmulos tributários, pena é que na liberdade em que vivemos passemos fome, pena é que na liberdade em que vivemos somos profundamente tristes, pena é que este género de liberdade nos esvaziou de energia reivindicativa, da capacidade de lutar sequer por direitos básicos, da capacidade de gritar, da capacidade de inventar, da capacidade de raciocinar... de nos unirmos por causas (antes dos seus efeitos)... Pena é que esta liberdade em que vivemos não é mais do que um embuste.


Sou incapaz.


Confesso-me incapaz até de fugir daqui, e esta incapacidade assumida faz de mim um estranho ser abjecto. Agarro-me a (falsas) soluções apaziguadoras para não desnortear]

3 comentários:

J. disse...

Para começar, permite-me uma imensa discordância : "um ser abjecto", tu? Não me parece que tenhas razão.
Para acabar, realmente há situações em que um cidadão parece um títere nas mãos de poderes que parecem intocáveis. Exagero, um títere, não : desarmado e sem capacidade de resposta directa contra determinadas prepotências. Esses senhores de EDP, PT, GALPs nunca vão a eleições, ao contrário de um governo que, em última instância, ainda poderá ser "castigado" pelo voto dos eleitores. É de desesperar às vezes mas não desesperes : nem que seja porque tens ao teu lado muitas outras vozes que pensarão como tu. Como primeira acção, a EDP precisava de um bocado de terrorismo artístico, assim uma coisa estilo Banksy que pintasse a sede da empresa com algo à medida que eles merecem.

J.

éme. disse...

Há pensamentos em sintonia nesta coisa da rede, sem dúvida, e, atrevo-me: se nesta coisa da rede os há, imagina como seriam tão mais se nos encontrássemos regularmente e em jeito de tertúlia-revolucionária (como todas serão, a bem dizer...)!
Estava eu a ler-te quando me passou pela ideia uma forma de luta tipo Banksy, precisamente... depois salto aqui e zumba, cá leio j. a pensar exactamente assim... é! É isso mesmo! É preciso sair à rua e voltar a fazer da des-energia, a que nos levou esta faz-de-conta que é democracia em que vivemos, força de combate.

Urge despertar!
É preciso exigir mudança.
Creio (ainda) que a palavra tem real força de acção política mas começo a crer que é preciso escrevê-la maior e levá-la mais longe... Devíamos pensar como fazer isto e, se bem pensarmos, melhor o faremos, não?
(às vezes - demasiadas - também me apetece ir embora daqui mas, depois, fico sempre com aquela impressão presa de: para onde?!)

Fiquemos!
Resistir é preciso!

Carla Alexandra Gonçalves disse...

Meus amigos:
gosto da ideia do terrorismo artístico, parece ser a única forma possível de levantar os braços.
[E]
O governo que Portugal tem, é o governo que Portugal merece.
abraços
c.a.g.