sexta-feira, outubro 17, 2008

emoção e sentimento

«Os sentimentos, juntamente com as emoções que os originam, não são um luxo. Servem de guias internos e ajudam-nos a comunicar aos outros os sinais que também os podem guiar. E os sentimentos não são nem intangíveis nem ilusórios. Ao contrário da opinião científica tradicional, são precisamente tão cognitivos como qualquer outra percepção. São o resultado de uma curiosa organização fisiológica que transformou o cérebro no público cativo das actividades teatrais do corpo.

Os sentimentos permitem-nos entrever o organismo em plena agitação biológica, vislumbrar alguns mecanismos da própria vida no desempenho das suas tarefas. Se não fora a possibilidade de sentir os estados do corpo, que estão inerentemente destinados a serem dolorosos ou aprazíveis, não haveria sofrimento ou felicidade, desejo ou misericórdia, tragédia ou glória na condição humana.»

António Damásio, O Erro de Descartes, emoção, razão e cérebro humano, Lisboa, Publ. Europa-América, 1995, p. 17

Certo é que as emoções adultas experimentam-se, e ocasionam importantes alterações corporais. As alterações principais desencadeadas verificam-se, para Damásio (facto facilmente corroborável pela experiência de vida), ao nível do funcionamento visceral (coração, intestinhos, pulmões e pele), muscular e esquelético e ainda no funcionamento das glândulas endócrinas.

Na emoção…

«O cérebro liberta moduladores pépticos para a corrente sanguínea. O sistema imunológico também se altera rapidamente. O ritmo de actividade dos músculos lisos nas paredes das artérias pode aumentar e originar a contracção e o estreitamento dos vãos sanguíneos (o resultado é a palidez); ou diminuir, caso em que os músculos lisos relaxam e os vasos sanguíneos se dilatam (o resultado é o rubor). De um modo geral, o conjunto de alterações estabelece um perfil de desvios relativamente a uma gama de estados médios que correspondem ao equilíbrio funcional, ou homeostase, de acordo com o qual a economia do organismo funciona provavelmente no seu nível óptimo, dispendendo menos energia e procedendo a ajustamentos mais simples e rápidos.» (Damásio, 1995: 150)

O sentimento de emoção…
«À medida que as alterações [provocadas pela emoção] no seu corpo vão tendo lugar, fica a saber da sua existência e pode acompanhar continuamente a sua evolução. Apercebe-se de mudanças no seu estado corporal e segue o seu desenrolar durante segundos ou minutos. Este processo de acompanhamento contínuo, esta experiência do que o corpo está a fazer enquanto pensamentos sobre conteúdos específicos continuam a desenrolar-se, é a essência daquilo a que chamo um sentimento. Se uma emoção é um conjunto das alterações no estado do corpo associadas a certas imagens mentais que activaram um sistema cerebral específico, a essência do sentir de uma emoção é a experiência dessas alterações em justaposição com as imagens mentais que iniciaram o ciclo. Por outras palavras, um sentimento depende da justaposição de uma imagem do corpo propriamente dito com ma imagem de alguma outra coisa, tal como a imagem visual de um rosto ou a imagem auditiva de uma melodia. O substrato de um sentimento completa-se com as alterações nos processos cognitivos que são induzidos em simultâneo por substâncias neuroquímicas (por exemplo, pelos neurotransmissores numa série de pontos neurais, em resultado da activação dos núcleos neurotransmissores que faziam parte da resposta emocional inicial).» (Damásio, 1995: 159).

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