sexta-feira, outubro 24, 2008

senza tempo, à luz de um despertador amortecido

As mãos caíam-me sobre as pernas indolentes e não conseguia senti-las. Era como se não as tivesse, ou como se elas nunca tivessem existido na permanente confusão que sinto, entre o meu corpo e a sua ausência, ou entre a carne e as maravilhosas aptidões do espírito.

Olhava aqueles longos dedos como se não fossem meus, porque lhes faltava o ânimo expressivo que devia comandá-los sobre a languidez das pernas.

As pálpebras abraçavam-me intensamente o olhar, como amortecidos suspiros de afectos escondidos sob a mirada turvada pela loucura da preguiça.

Naquele instante, só do peito brotava um quente sussurro, escutando-se dali ao fundo um quente e vagaroso tique-taque que me dava conta da vida.

Eram oito horas da manhã, altura em que devia começar a sentir as pernas, e os dedos, e o corpo inteiro a sair da indolência, mas fiquei onde me colocara havia horas, escutando, do leito onde me estendera, aquele compassado bater do coração.

Se aguçasse os sentidos escutaria os lamentos do vento ao tanger as árvores que, do lado de fora da vidraça, passavam o tempo sem mácula, numa parceria de semi-eternidades. Esse mesmo tempo que me dá conta da vida, ou outro tempo, o das árvores uivantes ao vento que chora e que, do lado de fora do meu espaço quente, se quedam nos minutos, tornados séculos.

Sem comentários: